fragmentos


Quem me dera o dia tivesse muitas horas e que essas se pudessem multiplicar em três, ou quatro, como quiséssemos, e nos pudéssemos olhar e tocar, sem pressa, sem um ruído, sem uma ânsia que nos seja exterior.Acordei esta manhã e agarrei-me a ti. Se queres saber, não é a melhor posição para voltar a dormir, isto é, a mais confortável fisicamente. Mas o teu cheiro, a tua pele, os teus pêlos, a tua respiração não têm nada que ver com coisas finitas como o corpo. A minha ligação a ti ultrapassa o tempo, o corpo, e até o futuro. Olho para a nossa casa, outra vez pela janela, e reparo no tecto de uma casa quase em ruínas. O tecto é abaulado e é miraculoso como não cai quando dois pombos se enamoram no ponto mais íngreme. Do outro lado da casa, há outra janela. É como se fosse uma janela para o paraíso. Há flores, há palmeiras, há limoeiros, há buganvílias, há cactos gigantes, há um carreiro de pedras e um recanto totalmente tapado por trepadeiras onde está uma mesa e cadeiras e onde eu colocaria um assento feito de pedra caiada e onde adormeceria à tarde, agarrada a ti. Se eu pudesse acrescentar mais coisas, juntaria um cheiro a jasmim que chega depressa à meia-noite e foge assim como quem passa, pede um cigarro e vai acendê-lo para casa.Poderia estar horas a olhar por estas duas janelas. Era isso que me apetecia. Gostava que gostasses tanto das manhãs como eu.

 

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